Em 1962, Paulo Merêa publicou um artigo em que criticava a atribuição do género masculino à palavra usucapião feita no Vocabulário Ortográfico da Academia das Ciências de 1940 e num anteprojecto parcial do Código Civil (v. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, vol. XXXVIII, págs. 244 e segs.).
Os argumentos de Merêa a favor da atribuição do género feminino à palavra eram:
a) que em latim "usucapio" era do género feminino;
b) que as palavras que nas línguas românicas representam "usucapio" são do género feminino;
c) que os juristas do século XIX atribuíam o mesmo género feminino à palavra;
d) que as palavras análogas (ocasião, religião, rebelião, etc.), derivadas de femininos latinos, femininos são.
Merêa citava como atribuindo o género feminino à palavra os dicionários de Morais, Torrinha e Fernando J. da Silva. Atribuindo-lhe o género masculino, citava o dicionário de Cândido de Figueiredo e o Dicionário Contemporâneo.
Notava Merêa que no Brasil era frequente, de há muito, dar usucapião por masculino – embora também houvesse quem usasse a palavra como feminina.
Antunes Varela, Ministro da Justiça, e que mantinha com Merêa contactos sobre problemas linguísticos do projecto do Código Civil, submeteu ao juízo de Salazar o problema consistente em saber se o Código deveria dar usucapião por masculino, como o anteprojecto fazia, ou se devia seguir o conselho de Merêa. Achava Antunes Varela que o problema era também político por, alegadamente, o Vocabulário de 1947 aprovado pelas academias portuguesa e brasileira dar a palavra por masculina.
Salazar respondeu não ver maneira de ignorar o Vocabulário, por este só poder ser alterado pelas duas academias (a carta de Varela a Salazar e a deste a Varela foram publicadas por Varela na obra colectiva "A Feitura das Leis", vol. I, INA, 1986).
A verdade, porém, era que o Vocabulário não atribuía nenhum género à palavra e, assim, Varela, no texto definitivo do Código Civil de 1966 (hoje vigente), acabou por dar a palavra por feminina (v. sobretudo artigos 1288 e seguintes).
A generalidade dos juristas segue o Código Civil.
Os dicionários parecem, na maioria, atribuir o género feminino à palavra. É o caso do Vocabulário de Gonçalves Viana, do Aurélio, do Lello Universal e do Porto Editora, para além dos citados por Merêa. Em sentido oposto, além dos citados por Merêa, é de referir o Grande Dicionário da Língua Portuguesa.